segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

O frio é triste

Enquanto a lareira fumega, eu enfio a cabeça lá dentro e fumego também. Fumego na vida e no trabalho e nas obrigações. Como é possível agir quando as mãos e os pés estão gelados? Assim não, primeiro, deixem-me aquecer um pé de cada vez e alternar as mãos com que escrevo, para nenhuma ganhar vantagem. O frio é a maior tristeza da vida. Quando era pequenina, e hoje, que continuo a medir 160 centímetros, o que mais me fazia temer a morte era o frio da morte, o frio de uma campa à noite, à chuva, ao vento. Morrer sim, mas só no verão, e de preferência com companhia. E longe da praia, que mesmo no verão, quando anoitece, gela-nos os ossos até nunca nos esquecermos do poder avassalador do frio. Era para ser uma noite de rebeldia e amor, mas foi apenas uma noite para esquecer, o frio na praia, a procura de posições que fizessem emanar calor de dois corpos, rochas como abrigos - percebi porque dormiam em grutas os homens antigos - uma pequenez, um futuro que não existe sem ser aquele, dois corpos a tremer, dois corações acelerados pelas razões diferentes da que se quer. O frio e a tristeza só são suportáveis porque lhes é inerente o seu oposto, e é bom que contenham em si uma perspectiva disso mesmo. Acho que vou dormir, porque depois da noite há o dia.

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