Durante muito tempo mantive a convicção de que não conseguiria escrever sobre aquela casa.
Foi assim que a reencontrei: abandonada, sem palavras, sem seiva, seca, destruída, amarfanhada como uma coisa que se enfia no bolso para esconder e que se esquece e lá permanece a ganhar mofo. Carcomida por ervas daninhas e pela vida inacabada de alguém.
Na bancada, ovos de variados tamanhos, um saco com os últimos figos da estação e uma galinha arranjada e pronta a cozinhar ofertas dos vizinhos que me enxugam as lágrimas e me incentivam a fazer tudo de novo.
Agora, que já senti a terra entre os dedos, que acordo com vontade de ouvir aquilo que só aqui se ouve àquela hora, sei que aqui é o meu lugar, e que aqui farei crescer novas raízes que me vão dar sombra, quando o sol é demasiadamente quente para suportar, ou abrigo, quando for preciso resguardar-me da chuva.
Que comecem os trabalhos e os dias na (tão) nossa casa.